segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Croá tipico da região de Pindoguaba,distrito de Tianguá, representa tudo na vida de Dona Maria

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MARÍLIA CAMELO
Pastora da Silva, 52anos, é a única do Grupo que tece jogos americanos e passadeiras com croá e barbante
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Andreza costuma fazer o trançado com o croá no portão de casa. Dessas cordas, surgem os diferentes artigos de decoração, como luminárias, porta-garrafas e móveis.
 
Um tipo de vegetação sem valor no passado hoje representa tudo na vida de Maria Pastora da Silva. Há três anos, ela desenvolve trabalho artesanal com o croá, típico da região de Pindoguaba, distrito de Tianguá, Serra da Ibiapaba. Ainda criança, teve o primeiro contato com a fibra, quando aprendeu a fazer cordas para armar redes de dormir e arreios de animal. Era comum pegar a matéria-prima nas redondezas.

Aos 52 anos, Pastora ainda entra no mato em busca do croá. "É uma lida difícil, precisamos ter muito cuidado por causa dos espinhos", explica. A diferença é que, agora, de suas mãos saem peças decorativas e utilitárias, principalmente jogos americanos e passadeiras, a sua especialidade no tear.

Nascida em Pindoguaba, a artesã se casou aos 18 anos com o agricultor Antônio Lima, 57. Da união, nasceram 11 filhos. "Fomos morar numa fazenda, em Piracuruca, Piauí. Ficamos 11 anos lá. Era tão deserto que nem cantiga do galo escutava. Não tinha escola para os meninos", diz Pastora, que concluiu a 8ª Série após voltar, há 11 anos, para a terra natal.

Tear

O retorno ao ofício com a fibra, largado quando tinha 15 anos, aconteceu há pouco mais de três com o surgimento do Grupo Flor do Croá. Embora domine todo o processo, ela é a única que sabe lidar com o tear manual, onde tece fios de barbante e o croá juntos. "Nunca tinha trabalhado no tear antes. Aprendi num curso".

Pastora dedica todas as tardes, de segunda a sexta-feira, à tecelagem. Nesse período, consegue concluir quatro jogos americanos (30x40), vendidos por R$ 30,00. Caso tenha de entregar encomendas, o horário é ampliado.

Mesmo com tanta dedicação, a renda ainda é insuficiente para a sobrevivência da família. Diz que apenas uma vez conseguiu mais de R$ 100,00 por mês. Por isso, procura outros meios. Além de ajudar ao marido na roça, integra um grupo de produção de artigos de limpeza também criado pela Associação. A ele, dedica duas manhãs por semana. Para vender, sai de porta em porta pelas comunidades vizinhas. "Consigo apurar cerca de R$ 95,00 por mês. Também recebo Bolsa Família no valor de R$ 134,00. Só Deus sabe como a gente vive. Comemos da nossa roça, mas também depende de um bom inverno".

Numa casa simples, com seis quartos, duas salas, e banheiro, ela mora com o marido e mais seis dos 11 filhos. Em uma das salas, há uma bateria, da banda de forró de dois deles: Arnaldo e José. "Eles já foram tocar até no Piauí", orgulha-se a mãe, que gosta muito do ritmo. "Eu danço com as colegas do meu grupo de idosos. Meu marido não se incomoda".

Possuir uma casa melhor ou reformar a que mora é um dos sonhos acalentados pela artesã. Outro é comprar a geladeira e a máquina de costura, que poderia lhe proporcionar mais uma fonte de renda. E mais: visitar dois filhos que moram no Rio de Janeiro, Antônio Marcos e Armando, que trabalham num lava a jato. "Sinto muita saudade deles, Ave Maria!".

Recompensa

Segundo essa mulher das fibras, o que lhe dá prazer mesmo é participar de feiras de artesanato e receber os elogios do público: "Tem uns que se encantam. A gente fica tão satisfeita. É uma recompensa, mesmo que não venda", confessa.

Pastora lembra também que se emocionou quando viu peças do Grupo expostas em ambientes da Casa Cor Ceará 2007, evento de decoração em Fortaleza: "Fui com outras participantes a convite do Sebrae. Achei tudo maravilhoso".

FRAGMENTOS
O desabrochar da flor do croá

Em 1850, os moradores de Pindoguaba, um distrito de Tianguá, já produziam cordas com o croá, que eram utilizadas nas construções das casas de taipa e para amarrar animais. O uso da planta farta e típica das regiões áridas não passava disto. "Aos poucos, a comunidade, com cerca de 2.500 pessoas, passou a se interessar pelo resgate dessa cultura", comenta o presidente da Associação de Desenvolvimento Comunitário de Pindoguaba, Francisco das Chagas Sobrinho. A partir de então, também foi criado, com apoio do Sebrae, o grupo Flor do Croá, no qual estão cadastrados 22 artesãos, mas apenas 12 se dedicam diretamente ao trabalho. Dentre eles, nove são mulheres.

O grupo já teve um showroom chamado "Casa Cor", onde as criações ficavam expostas de forma ambientada. Em decorrência das chuvas, precisou mudar de endereço e, agora, o ambiente é bem menor. Os artesãos trabalham, principalmente, sob encomendas. Um dos projetos, segundo Chagas, é resgatar a importância que a fibra tem no desenvolvimento local. Dentre as iniciativas está a participação no Movimento Comércio Justo e Solidário, em parceria com o Sebrae, além da criação de um site que entrará na rede em maio.

Fios cheios de esperança

Antes de o croá ser descoberto como matéria-prima de produtos artesanais em Pindoguaba, Andreza Oliveira de Lima, 31 anos, levava uma vida comum às mulheres do distrito: tomava conta da casa, dos filhos e participava de um projeto social, no qual fabricava produtos de limpeza. Continua com as mesmas atividades, porém acrescentou à rotina a arte de trançar móveis e objetos decorativos.

É no portão de ferro, da casa onde mora, que Andreza passa horas de pé fazendo o seu trançado. Um molho da fibra é amarrado na grade para ser enroscado até formar a corda.

Os fios vão sendo emendados, formando uma espécie de novelo de lã. A partir daí, o croá está pronto para ser transformado em peças como luminárias, estantes, mesas, bancos, cadeiras e o que for necessário.

A artesã costuma fazer a primeira etapa do trabalho em casa, quando tem uma folga, ou à noite. Na parte da tarde, reúne-se com o Grupo Flor do Croá, na sede da Associação do Desenvolvimento Comunitário de Pindoguaba. Por mês, Andreza consegue ganhar algo em torno de R$ 60,00.

Mais do que uma fonte de renda, o artesanato se transformou numa terapia para Andreza. Separada e mãe de duas crianças, Andreane, 11anos, e Gleyciano, 9, ela tenta recomeçar a vida. Durante muitos anos, sofreu calada ao lado de um companheiro agressivo. As ameaças eram constantes e ela temia pela segurança da família. "Precisei registrar ocorrência na delegacia de polícia para conseguir que ele deixasse a nossa casa", recorda.

Aos poucos, Andreza começa a recuperar o prazer de viver. Afinal, já passou por alguns traumas emocionais. Quando nasceu, com apenas dez dias, foi deixada nos braços da avó materna, Maria Ana, atualmente com 85 anos.

Somente com dez anos conheceu a mãe biológica. No entanto, não conseguiu recuperar os laços afetivos. Embora não guarde mágoas ou ressentimentos, a artesã considera a avó como sua verdadeira mãe.

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